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Departamento de Ciências Sociais Aplicadas

Ensino, Pesquisa e Extensão

CEFET-MG

“Inovação e planejamento são muito importantes no processo empreendedor”

Segunda-feira, 17 de abril de 2017
Última modificação: Segunda-feira, 17 de abril de 2017

Professora Glauciene Martins – DCSA / CEFET-MG

“Inovação e planejamento são muito importantes no processo empreendedor”

Professora da Administração analisa o papel do empreendedorismo em momentos de crise e afirma importância do perfil empreendedor para os cargos de liderança e de gestão

Os indicadores sociais e econômicos para 2017 não são animadores. Perspectiva de inflação de 4,6%, segundo o boletim Focus do Banco Central, e aumento de 2,9 pontos percentuais na taxa de desemprego no Brasil no 3º trimestre de 2016, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em relação ao ano anterior são alguns dos índices que confirmam um cenário de retração no país. Nessa conjuntura, o empreendedorismo tem sido apontado como uma das ferramentas para driblar a crise e gerar novas oportunidades de renda. Para a professora de Empreendedorismo do CEFET-MG, Glauciane Silva Martins, “o desafio em tempos de crise é construir e incentivar um contexto que desperte esse sonho nos indivíduos desde cedo”. Glauciane é doutoranda em Administração, pesquisa sobre inovação, inovação social e recursos humanos e falou sobre esses e outros temas.


Entrevista Publicada no site do CEFET-MG em 17/04/2017 (link)

Ser criativo e buscar a autorrealização são propulsores para a criação de um novo negócio. Quais outras características devem ser levadas em conta antes de se tornar um empreendedor?
Ser ou tornar-se um empreendedor são assuntos bastante difundidos, sobretudo quando nos referimos a questões como geração de renda, inovação, tecnologia e desenvolvimento econômico. Possuir um perfil empreendedor é importante não apenas para aqueles que pretendem obter sua independência por meio do próprio negócio, como também para aqueles que pretendem assumir cargos de liderança e de gestão.
O empreendedor do negócio próprio é o tipo mais conhecido. Mas há também outras possibilidades, como, por exemplo, tornar-se um empreendedor cooperado, um empreendedor individual, um empreendedor franqueado, um empreendedor social, um intraempreendedor (ou empreendedor corporativo), um empreendedor público e um empreendedor do conhecimento.

Algumas características recorrentes nos estudos de diversos autores sobre o perfil empreendedor são: assumir riscos, independência, responsabilidade, busca de oportunidades e iniciativa, persistência, informações, conhecimento, rede de contatos, planejamento, controle, exigir qualidade e eficiência, persuasão, comprometimento, estabelecimento de metas. Contudo, há várias características que estão presentes nos empreendedores e que também estão presentes em pessoas que não empreendem.

A intenção de empreender, embora não seja necessariamente uma característica, é fundamental no processo da formação empreendedora. Apesar de essa intenção depender de uma motivação que parte do próprio indivíduo, o desafio em tempos de crise é construir e incentivar um contexto que desperte esse sonho nos indivíduos desde cedo. Esse contexto pode ser o educacional, o familiar, bem como o econômico e social.

A crise representa uma oportunidade para aqueles que buscam empreender e conquistar independência financeira. Porém, pode, também, ser um período de adversidade para o empresário que não está devidamente preparado. Como o empreendedor deve se comportar em períodos de crise?
O risco (diferentemente da incerteza) pode ser calculado. A revisão do planejamento estratégico, o controle e os ajustes nos objetivos e metas podem diminuir os efeitos das adversidades quando há crise, pois o empresário consegue preparar sua empresa para redução do faturamento e aumento dos custos.

Dessa forma, o empreendedor deve tentar compreender em profundidade o contexto no qual atua, buscar informações, perceber as tendências ou mudanças no mercado e ouvir os experientes. Esses são alguns comportamentos recomendados que ajudam na identificação de oportunidades. Não basta fazer mais do mesmo ou fazer o mesmo daquilo que outros anteriormente fizeram em contextos distintos e obtiveram sucesso. A inovação, o planejamento e a construção de cenários são muito importantes no processo empreendedor. Por isso, o empreendedor deve ser uma pessoa com uma visão de futuro. Há diversas ferramentas desenvolvidas na área da Administração que podem auxiliar o empresário. O Plano de Negócios é a principal delas.

Vale lembrar ainda que, em tempos de crise, geralmente há um aumento no índice de desemprego. As pessoas conseguem tempo para direcionar seus esforços no sentido de conquistar sua independência financeira a partir da criação de um negócio próprio. Contudo, cabe lembrar que investir em oportunidades que prometem retorno rápido, mas que nada tem a ver com seus sonhos ou projetos de vida podem terminar em insatisfação. Além disso, é aconselhável pensar antecipadamente nas suas possibilidades de carreira, caso não esteja mais no emprego formal. A opção empreendedora pode fazer parte do seu projeto pessoal desde cedo, mesmo que seja apenas uma hipótese enquanto ainda é estudante.

A adesão a modelos de negócios como startups, escritórios compartilhados (coworking), aceleradoras e incubadoras de empresas têm crescido no Brasil e no mundo. Em que medida esses modelos representam oportunidades de consolidação das empresas em um cenário econômico e social cheio de incertezas?
Cada país possui uma política econômica que favorece determinados padrões na indústria, desenvolvimento setorial e tecnológico. Esses modelos de negócios são difundidos principalmente nos Estados Unidos e em alguns países da União Europeia. A consolidação de uma rede entre universidades, centros de pesquisa, empresas e investidores possibilitou a formação desses modelos de negócios compostos, sobretudo, por pessoas ligadas ao desenvolvimento de inovações, novas tecnologias e prestação de serviços. No Brasil, esses espaços são formados principalmente por jovens empresários que se unem para empreender, aprender e crescer. Às vezes tem relação com alguma universidade, mas nem sempre é assim.

Embora representem uma excelente oportunidade de consolidação de empresas, copiar um modelo que vem dando certo em outros países deve ser feito com cautela. Esses modelos de negócios permitem maior compartilhamento de informações e de conhecimento, geram aprendizado e proporcionam alguma economia em relação aos custos operacionais. Mas o principal benefício, a meu ver, é a formação de rede e de parcerias que esses modelos incentivam. Contudo, por se tratarem de negócios inovadores, envolvem riscos elevados, o que não é bom considerando o padrão dos investimentos em tempos de crise. Esses negócios necessitam de muitos estudos e de investimentos para desenvolver e entender o mercado alvo. A aplicação e difusão das novas tecnologias também exigem conhecimento e experiência que, tratando-se de ambientes coletivos de negócios, são mais bem explorados. Em suma, primeiramente deve-se considerar a disponibilidade de recursos (competências, recursos humanos, tecnologia, crédito e investimento) no contexto no qual a empresa está sendo desenvolvida e também levar em conta quais problemas e demandas da sociedade visam solucionar. A capacidade de geração de valor por parte dessas empresas vem chamando bastante a atenção dos pesquisadores nesse campo. São alternativas do padrão vigente de formação de empresas e vem sendo incentivadas em diversas políticas públicas no sentido de promover inovações.

Qual a importância da gestão dos recursos humanos para a criação de um plano de negócios e para o desenvolvimento de um novo empreendimento?
A gestão de recursos humanos é apontada pelos empresários como um grande desafio quando se fala no desenvolvimento de um novo empreendimento. Muito se repete que “as pessoas são a principal fonte da vantagem competitiva da empresa”, contudo, é um tópico que fica em segundo plano na criação do plano de negócios. Às vezes, os recursos humanos aparecem apenas como um fator gerador de custos e despesas. Todavia, é uma dimensão que poderia ser considerada como principal investimento para sustentabilidade do negócio.

Mais do que um bom planejamento estratégico dos recursos humanos, é importante considerar como o empreendedor irá criar mecanismos para que o funcionário possa demonstrar seu potencial e contribuir para o crescimento e consolidação do negócio. No plano de negócios é possível prever as categorias de remuneração, benefícios, cargos, plano de carreira, recrutamento e seleção e avaliação de desempenho. Mas, no dia a dia da gestão da empresa, muitos outros acordos tácitos são feitos. Em novos negócios, é necessário se pensar em como funcionário e empresa podem crescer juntos. A gestão de recursos humanos, assim, envolve o comprometimento de ambas as partes. O empresário e o funcionário devem trabalhar em uma relação de confiança e apoio mútuo. O empresário pode criar mecanismos de comunicação com o funcionário, com objetivo de ouvir suas sugestões, estabelecer uma política de recursos humanos que envolva os interesses dos funcionários, e, principalmente, o desenvolvimento de competências e aprendizado internos. Por exemplo, em algumas empresas, os funcionários podem se tornar acionistas e obter retornos financeiros conforme o desempenho da empresa no mercado. Outras empresas promovem workshops a fim de levantar projetos de funcionários que podem se transformar em novos negócios. Nesse último caso, os funcionários tornam-se também empreendedores e podem passar a ser fornecedores ou prestadores de serviços da empresa inicial. Enfim, não há uma regra. A tendência observada é que as relações de trabalho também sofrem mudanças nesse novo contexto econômico (comparando com o contexto da revolução industrial, que permitiu a consolidação do modelo econômico vigente).

Segundo a agência de pesquisa de consumo Nilsen, dois terços dos consumidores preferem comprar de empresas socialmente e ambientalmente responsáveis. Na prática, como se caracteriza o empreendedorismo social?
O termo “empreendedor social” é relativamente recente. Embora não exista um consenso sobre o que vem a ser empreendedorismo social, o empreendedor social geralmente tem como missão de vida construir um mundo melhor para as pessoas. Por meio de suas ações e das organizações que criam, eles suprem lacunas que nem sempre o poder público consegue suprir. Além disso, propiciam o engajamento dos consumidores com causas sociais e solucionam problemas e demandas da sociedade. O empreendedor social pode obter lucro ou não por meio de suas iniciativas. Mas a principal característica desse tipo de empreendedor é que ele visa solucionar problemas sociais ou cumprir um objetivo social ligado geralmente à educação, à sustentabilidade e preservação do meio ambiente, à promoção da diversidade, arte, cultura, à melhoria da qualidade de vida das pessoas, ao acesso a novas tecnologias, à erradicação da pobreza e geração de renda, à democratização do comércio (acesso a bens e serviços para camadas desfavorecidas financeiramente), dentre outros. É um tipo de empreendedorismo que vem sendo bastante incentivado, sobretudo por propiciar autorrealização do indivíduo ao mesmo tempo em que gera transformação social. É uma maneira de fazer a diferença no mundo no qual vivemos.